domingo, 8 de janeiro de 2017

Amir Abedzadeh trocou estrelato no Irão pelo Barreiro, devido a Manuel Bento

Por: Tiago Filipe Silva in Mais Futebol

Deixou a primeira liga no país de origem pelo Barreirense e quer seguir as pisadas do pai, com o apoio de milhares que o seguem nas redes sociais.


Manuel Galrinho Bento. A memória do mítico guarda-redes português ainda perdura nas gentes do Barreiro.

O palco dos espetáculos já não existe, mas subsiste a responsabilidade de elevar a história do clube.

 Sempre que veste a camisola do Barreirense, Amir recorda o motivo que o fez embarcar naquela viagem de avião de nove horas e deixar a sua casa.

Aos 23 anos, o guarda-redes partiu em busca de um sonho e trocou o Teerão e o Persepolis, da primeira divisão iraniana, pelo histórico emblema do Barreiro, agora no Campeonato de Portugal.

A escolha terá sido algo estranha para alguns, mas teve uma razão aparentemente lógica.

«Uma das razões foi o Manuel Bento, sempre gostei dele e vi a sua história neste clube. Quando o melhor guarda-redes português saiu daqui para o Benfica e se tornou uma lenda, pensei “por que não eu?”. Com trabalho acredito que consigo também»


A experiência em Inglaterra foi positiva mas algumas «questões burocráticas» dificultaram a permanência. Nos states teve a oportunidade de jogar com regularidade e isso abriu-lhe as portas para a seleção, o que o fez antecipar o regresso ao Irão, mas de olho na Europa.

«Sempre me imaginei em grandes equipas europeias e teria de começar por algum lado. Muitos pensam que isto foi um passo atrás, mas para mim foi um grande salto e estou feliz por esta decisão. Poucos o fariam, é um grande risco, mas gosto disso», explicou.

Para o Barreiro trouxe pouca coisa, uma bagagem levezinha, até porque já carregava um peso muito maior sobre os ombros.

Um apelido que pesa bastante por aqueles lados do mundo.

«O ele ser meu pai dificulta muito as coisas»

O Amir do Barreiro procura atingir os maiores palcos do futebol, mas na realidade já está habituado a essa coisa da fama desde sempre.

Só para ter uma ideia, no Instagram são quase 150 mil as pessoas que seguem atentamente os seus passos.

«As pessoas no meu país ficam sempre atentas às redes sociais, porque muitas das vezes não há hipóteses de assistir aos jogos, então é uma forma de transmitirem apoio. Sei que um dos motivos é a popularidade do meu pai, mas espero um dia retribuir tudo», atirou.

Amir é uma superestrela no Irão e boa parte disso deve-se ao pai.

Ahmadreza Abedzadeh, o nome provavelmente diz pouco aos portugueses, mas o antigo guarda-redes está na história do futebol iraniano, tendo sido eleito até o melhor da Ásia.

Apesar de ter começado tarde, em pouco tempo chegou à baliza da seleção e foi determinante no apuramento para o Mundial 98’, graças a um brilharete no play-off, frente à Austrália.



«Mais de vinte anos depois todos se lembram como se fosse ontem. Defendeu tantas bolas que o treinador disse que não tinham ganho se não fosse ele. O Irão perdia 2-0 e também a esperança, mas aquela cambalhota (4m00’) mostrou que estava tudo tranquilo e que eles iam marcar mais golos», lembrou.

E marcaram, de facto. O Irão empatou um jogo dado como perdido e agarrou uma vaga no Mundial.

Foi de brilhozinho nos olhos que Amir relatou esse episódio do pai, sempre com um olhar de soslaio para a cadeira ao lado.

Ahmadreza escutava tudo o que o filho dizia como se percebesse só pelo olhar, até porque na realidade não entendia inglês, razão pelo qual foi necessária a tradução para pársi.


O ex-jogador foi visitar o filho, à margem da assinatura de um protocolo com uma marca de luvas, que previa a exportação para o Irão.

Trocou camisola e calções pelo fato e gravata, mas mantém a ligação ao futebol.

«Sempre gostei de jogar futebol, mas não era fácil naquele tempo. Raramente conseguia ver a minha família por estar em estágios ou na seleção. Às vezes falhava até passagens de ano com eles. Agora estou envolvido na área e tento ajudar a evoluir o futebol iraniano», vincou.

Na lembrança mantém-se a despedida dos relvados, há pouco mais de dez anos, que teve a bênção de Oliver Kahn.

«Em 2006 o Persepolis defrontou o Bayern Munique num amigável e ter 80 mil pessoas a entoar o meu nome foi incrível. Irei recordar-me disso para sempre», referiu.



O testemunho foi passado ao filho, ainda que não de forma propositada. Mesmo distante, Ahmadreza permanece atento ao percurso de Amir e acredita que pode chegar longe.

«Não o digo por ser meu filho, mas para mim é um dos melhores guarda-redes do Irão. Estou feliz pela escolha que fez. Veja-se o Diego Costa, que esteve aqui na II Liga e agora no está no topo. É um bom país para alcançar grandes sonhos e no futuro irão dar-me razão», frisou.

Palavra de pai, mas mais do que isso também.
É o meu ídolo, fez-me apaixonar pelo futebol e ensinou-me tudo. Dizem que é bom ser filho de uma estrela, mas dificulta muito as coisas. Tentam sempre comparar-me, mas procuro não deixar que o futebol afete a minha relação com ele, porque sempre foi um grande pai»
Em alternativa, o jovem quer levar o nome da família aos grandes palcos.

A realidade à beira do Tejo e o sonho aqui tão perto

Amir tenta a sorte no futebol português com a esperança de seguir as pisadas de alguns que por cá passaram. Entre eles Nilson, veterano guarda-redes agora no União da Madeira que, para além de colega no Irão, foi «um dos impulsionadores» da vinda para a Europa.

O Barreirense não atravessa uma situação fácil, ocupando a antepenúltima posição da Série G. Amir sofreu nove golos em oito jogos, até à data, mesmo assim disse estar otimista, considerando que é a altura certa para estar no futebol português.

«Está a correr bem até agora, tenho ganho muita confiança com os jogos e estou feliz com as exibições, bem como os treinadores. Aqui estão a reforçar a aposta nos jovens agora, por isso tenho confiança no futuro», afirmou.

No Campo da Verderena tem dado nas vistas pelo jogo de pés, mas sublinhou que o objetivo é tornar-se um guarda-redes completo.
«Gosto do Nilson porque joguei com ele e sei das suas qualidades, mas gosto da confiança do Rui Patrício e da leitura de jogo do Ederson. Tento assimilar um pouco de cada um para atingir a perfeição»
Em apenas quatro meses já aprendeu muitas palavras em português e percebe quase tudo o que dizem os colegas. Pelo ritmo da coisa, ainda vai a tempo de aprender a falar também.

Vistas bem as coisas, a introdução às línguas latinas facilitava-lhe a vida quando embarcasse numa outra viagem. A mais desejada.
Madrid.

«Sonho chegar ao Real Madrid e não vou parar de tentar até o conseguir. Quando vejo guarda-redes das equipas de topo penso que não tenho nada a menos do que eles. Há casos de jogadores que começaram tarde e chegaram alto, por isso ainda acredito», revelou.

É isso que lhe alimenta a alma todos os dias quando se deita, pensar que o sonho está mais próximo de se tornar realidade, até geograficamente falando.


Por agora, o presente está nas margens do Tejo, num clube carregado de memórias e sob os olhares de quem já viu outrora a arte de um dos melhores de sempre.

É filho de peixe, sim, mas quer nadar sozinho.

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